sábado, 20 de fevereiro de 2010

Nobreza de araque e ladrões engravatados



Copiado da Agência Carta Maior

DEBATE ABERTO

Nobreza de araque e ladrões engravatados

Um dos artifícios de proteção dos mais ricos e influentes é o de chamar furtos, apropriações indébitas e coerções de crimes de ‘colarinho branco’, isto é, os que são cometidos pelas autoridades de Estado e pelos burgueses engravatados.

Luís Carlos Lopes

Há quem ache estranho a dificuldade brasileira de se tratar pessoas que ocupam cargos públicos mais elevados ou dispõem de grandes recursos financeiros como se fossem cidadãos comuns. Estes últimos, isto é, a maioria, quando cometem crimes são processados, presos e tem que responder pelos seus atos. Se forem mais pobres ou mais negros são logo enviados para presídios e outros depósitos de gente, sob as penas da lei. Não raro, são executados nas ruas, antes de viverem seus infernos judiciais e prisionais. Os valores e as propriedades das elites, bem como a cor da pele e o pertencimento a famílias ou grupos políticos e sociais influentes garantem maior impunidade.

O mesmo crime tem respostas estatais diversas. Um dos artifícios de proteção dos mais ricos e influentes é o de chamar furtos, apropriações indébitas e coerções de crimes de ‘colarinho branco’, isto é, os que são cometidos pelas autoridades de Estado e pelos burgueses engravatados. Diferenciando-os por meio de um nome pomposo, tem-se pronta uma estratégia para encobri-los. Os mecanismos reais existentes, usados pela velha máquina de Estado, estão muito distantes do edifício das leis e normas processuais. Vários procuradores e juízes democratas e defensores da virtual cidadania brasileira fazem sua parte. Tentam conseguir que a lei seja cumprida com equidade e que as elites sejam punidas. Há, felizmente, juízes que decidem respeitando a lei e o consenso crítico da população. Outros agem em sentido contrário, derrubando decisões, usando as tecnicalidades jurídicas para ofender o senso básico da racionalidade e da moralidade etc. Em suma, ajustando-se as situações encontradas aos interesses políticos e sociais que se escondem nas sombras do mesmo Estado.

Quando ocorre o recolhimento à prisão de um banqueiro que roubou milhões e a condenação de autoridades que participavam na mesma quadrilha, isto ganha as manchetes da grande imprensa. O espanto é porque tal fato consiste em algo inusual no Brasil. Os pequenos progressos dos direitos de cidadania são comemorados pelos democratas do país e odiados pelas elites. Estas gostariam de jamais serem condenadas por nada. Afinal, prisão é para pobre, preto e para quem mora longe. Por isso, eles usam dos seus privilégios para não irem para cadeia, mesmo condenados ou pegos em fragrante delito. Quando isto ocorre, a explicação está, por exemplo, na existência de um confronto entre o Estado e o criminoso ou um clamor social latente que chega de algum modo às grandes e pequenas mídias, pressionando nesta direção.

Na letra da lei, todos são iguais. Na prática da mesma, alguns são menos iguais do que outros. Nada disto é novo. Repete-se melancolicamente há muito tempo, remontando às origens do Estado e da Sociedade no Brasil. Todos sabem que é assim e muitos acreditam que assim sempre será. Isto se relaciona ao fato de que os compromissos assumidos nas mudanças históricas do país jamais foram rasgados. Mudar sem que as estruturas de poder sejam alteradas em profundidade é um mandamento do devir brasileiro. A impunidade das elites é coisa antiga que vem se renovando e se readaptando às novas circunstâncias que se colocam em cada contexto.

Ainda existem traços nobiliárquicos na formação social brasileira. A ocupação de altos postos de Estado é entendida como uma bruta ascensão social, política e ideológica. Estar neles por ter sido eleito ou por pertencer a uma das complexas clientelas do poder é compreendido por alguns como um salvo-conduto. Isto inclui fazer o que se bem entende, inclusive furtar o erário público ou intermediar a ação de empresários ladrões, lucrando por fora. Essas pessoas acham que a lei é para os outros e não se aplica ao comportamento daqueles que são um simulacro de nobreza togada. Esses pseudonobres, mesmo que sejam simples ladrões, contam com a pompa e a circunstância de seus cargos, suas relações de influência e os privilégios dados a eles pela própria legislação. São nobres de araque. Todavia, eles têm poder de fato e incontáveis meios de se proteger.

O Império e a ordem nobiliárquica da época foram derrubados, em 1889. O governo de Pedro II, apesar de esforços dos seus entusiastas, jamais poderá ser apartado do passado escravista brasileiro. Mesmo tendo mandado sua filha assinar o decreto da Abolição, a velha monarquia não poderá apagar sua forte ligação com a velha instituição escravista, em crise no mundo da época, muito antes de chegar ao fim no Brasil, em 1888. O golpe de Estado militar que inauguraria a república viria um ano e meio após. Os velhos barões imperiais transformaram-se na classe de proprietários de terra, agora sem escravos no velho sentido. Contudo o poder da terra conferiu a eles algo similar ao antigo poder nobiliárquico. As coisas mudaram, mas não muito. A terra não foi repartida e dada aos escravos, bem como lhes foi negada a instrução básica.

Foi no governo de Pedro II que as bases do Estado brasileiro foram assentadas, bem como alguns aspectos da vida social, política e cultural do Brasil, de alguma forma ainda presentes. A partir daí, todas as reformas que ocorreram nos últimos cento e cinqüenta anos se desenvolveram nos limites deste quadro, nunca inteiramente superado. Por aqui, como em toda parte, o passado dá um jeito de se manter no presente e influir no modo que a história segue seu curso. A luta pelos direitos coletivos e individuais de cidadania continua, como nunca, bastante atual.

Luís Carlos Lopes é professor e autor do livro "Tv, poder e substância: a espiral da intriga", dentre outros

domingo, 14 de fevereiro de 2010

A polêmica sobre a atualização dos índices de produtividade da agropecuária


Copiado da Carta Maior

DEBATE ABERTO


Se a agropecuária brasileira é, como tem sido alardeado amplamente pelos porta-vozes do agronegócio, um exemplo de modernização tecnológica, transformando solos antes considerados inférteis em áreas de altíssima produtividade, porque tantos protestos contra a atualização dos índices?

Leonilde Medeiros*

Em agosto de 2009, chegou à mídia mais uma rodada de discussões sobre a necessidade atualizar os índices de produtividade da agricultura brasileira. O Ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, com o apoio do chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, Luis Dulci, anunciou que a medida seria tomada em breve. Na ocasião, o ministro declarou que os novos índices eram “confortáveis para quem produzia na média regional” e deu alguns exemplos de áreas, reconhecidas como de domínio do agronegócio, que estariam abaixo dos valores efetivamente atingidos em safras anteriores. O ano findou, mas os índices não foram atualizados.

O tema não é novo. Os índices atualmente vigentes, calculados a partir do grau de utilização e de exploração econômica da terra, baseiam-se em números fornecidos pelo Censo Agropecuário de 1975, quando a modernização da agricultura e da pecuária brasileira dava seus primeiros passos. De lá para cá, essas atividades incorporaram muita tecnologia, tanto mecânica quanto química, além de avançarem no terreno das biotecnologias. No entanto, os índices nunca foram recalculados.

Em 2003, o MDA iniciou estudos para que fosse possível essa atualização. Para que os novos valores passem a vigorar, é necessária a oficialização, feita por meio de uma portaria interministerial, que deve ser assinada tanto pelo Ministro do Desenvolvimento Agrário quanto pelo da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Quando o estudo feito pelo MDA foi enviado para análise do Ministério da Agricultura, então dirigido por Roberto Rodrigues, este argumentou sobre a necessidade de novos estudos técnicos. Às vésperas das eleições presidenciais, em 2006, o governo decidiu não tocar mais no assunto, uma vez que logo se evidenciou que a medida proposta tinha um enorme potencial de gerar tensões. Decorridos dois anos do segundo mandato do presidente Lula, cresceu a pressão dos movimentos sociais (principalmente MST, mas também Contag), novos estudos foram feitos, e o governo, mais uma vez, anunciou, em meados de 2009, que iria atualizar os índices.

Como era de se esperar, a necessidade e a pertinência da atualização foi imediatamente contestada pela Frente Parlamentar da Agropecuária, conhecida como Bancada Ruralista, por meio de seu coordenador, deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR). Segundo ele, a atualização era um ato arbitrário, que contrariava os interesses do agronegócio brasileiro, notadamente daqueles que realmente produzem. O deputado afirmou ainda que, às vésperas do plantio de uma nova safra, o campo precisava de paz e tranquilidade. Faz parte dos argumentos sempre utilizados pela Frente a afirmação de que os produtores rurais vivem em dificuldades: pressão da legislação ambiental, dívidas, dificuldades de fechamento de contas em decorrência da política econômica e cambial, que penaliza o setor. Além disso, segundo o deputado Micheletto, o setor foi responsável, no primeiro semestre de 2009, por 26,46% do PIB nacional, 42% do total das exportações e 40,23% dos empregos gerados no país.

As declarações do deputado, na ocasião, foram marcadas por um tom de ameaça velada, típico dos discursos antirreformistas dos anos 1960, de meados dos anos 1980, por ocasião do debate sobre a Proposta do Plano Nacional de Reforma Agrária da Nova República e também das discussões sobre reforma agrária no início do governo Lula: “Caso essa inoportuna e perturbadora medida seja adotada, os agricultores não terão mais condições de continuar produzindo com tranquilidade neste país, surgindo daí um estado de calamidade. Tudo isso é lamentável, mas a FPA, esta bancada numerosa e articulada, formada por deputados e senadores de todas as correntes de opinião, não ficará jamais numa atitude apenas contemplativa diante dessa provocação e afronta aos produtores rurais” (www.noticiasagricolas.com.br/noticias.php?id=53358, 20/08/2009, grifos meus).

À mesma época, a senadora Kátia Abreu, presidente da influente Confederação Nacional da Agricultura, também saiu em defesa de suas bases, com algumas alegações interessantes para se pensar o significado político dos índices de produtividade. Além de considerar a medida um ataque à livre iniciativa, ela costurou argumentos que iam desde a pressão da política ambiental sobre os agricultores até a velha tese de que o governo tem muita terra pública que poderia ser direcionada para a reforma agrária. Trouxe ainda de volta argumentos em torno da importância do uso do Banco da Terra e da legislação que permite a compra de terras para fazer reforma agrária (www.agrosoft.org.br, 22/08/2009).

Desde então foram realizadas algumas audiências públicas no Senado, nas quais os que defendem a revisão afirmam que, em várias regiões do país, a produção atual está bem acima dos índices a serem fixados. Por outro lado, os que são contra alegam que a atualização geraria uma enorme insegurança e uma inédita crise de produção.

O debate se intensificou ao longo do segundo semestre de 2009 e o Ministro Stephanes disse publicamente que não assinaria a portaria. De fato, o ano findou e ela não foi assinada, mostrando a força e grande poder de veto do Ministério da Agricultura. Como o ano de 2010 é eleitoral, dificilmente uma medida tão polêmica entraria em pauta (como já não entrara em 2006).

Cabe perguntar: afinal o que está em jogo numa portaria interministerial, ou seja, um documento que sequer tem o estatuto de lei, não passa pelo Congresso Nacional e tem sustentação legal (a lei nº 8.629 de 1993, conhecida como Lei Agrária, prevê a atualização)? Por que essa portaria atrai tanta oposição e ira?

Um primeiro passo para entender essa polêmica é revisitar a discussão que vem marcando o cenário político brasileiro (e latino-americano) desde há muito: a ligação entre uso da terra/desenvolvimento/reforma agrária. Nos anos 1950, generalizou-se o uso da categoria latifúndio, termo que ganhou várias conotações, principalmente a de improdutividade da terra e de atraso tecnológico, mas também de exploração do trabalho e violência. Todo a polêmica sobre a necessidade de modernização da agricultura ou sobre a necessidade de redistribuição de terras fundava-se na crítica ao latifúndio. O próprio Estatuto da Terra, de 1964, tem seu suporte básico nessa visão, propondo a empresa rural (inclusive a de caráter familiar) como o alvo a ser atingido no processo de modernização das atividades agropecuárias.

Como todos sabemos, a modernização tecnológica se fez no Brasil sem alteração da estrutura fundiária, uma das mais concentradas do mundo, e com uma extraordinária capacidade de permanência e reprodução em áreas de ocupação mais recente, como nos mostram os recém divulgados resultados do último Censo Agropecuário, realizado em 2006.

A vitalidade e a visibilidade que as lutas por terra assumiram no início dos anos 1980 recolocaram o tema da reforma agrária na pauta política, mas num contexto em que o latifúndio, no seu sentido de atraso tecnológico, estava cada vez mais perdendo relevância em favor de uma crescente empresarialização das atividades agropecuárias. Uma transformação veloz, mas que não foi capaz de modernizar essas atividades para além do uso das tecnologias de ponta e da integração sistêmica com as indústrias à montante (máquinas, insumos, sementes) e à jusante (processamento e venda), já que se manteve, por um lado, a relação predatória com o meio ambiente, a qual caracterizou por séculos nossa agricultura, e, por outro lado, a utilização também predatória da força de trabalho, como o demonstram as sucessivas denúncias que chegam à mídia sobre trabalhadores encontrados em situações extremamente precárias, análogas à da escravidão. Nesse contexto, ganha novas cores o debate sobre a relação entre reforma agrária e desenvolvimento: não se trata somente de tecnologias, mas de acesso a direitos, tanto humanos como ambientais, fundamentais.

Os debates em torno do novo ordenamento legal do país, que se realizaram após o fim do regime militar e que resultaram na Constituição de 1988, trouxeram para a nossa Carta Magna um preceito já incorporado por diversas constituições do mundo: o de que a propriedade da terra deve cumprir uma função social, uma vez que não se trata de uma mercadoria como qualquer outra. O conceito de função social adotado não continha grandes novidades: foi apropriado do Estatuto da Terra e remetia tanto à dimensão econômica da exploração, como aos aspectos trabalhista e ambiental. O seu não cumprimento implicaria numa punição: a desapropriação por interesse social. Naquele momento, no entanto, a Bancada Ruralista conseguiu incluir no texto constitucional uma cláusula que instaurou uma contradição com o conceito de função social: terras produtivas não podem ser desapropriadas. Ora, uma propriedade pode ser altamente produtiva, mas não cumprir sua função social, quando se consideram as condições de seus trabalhadores e os custos ambientais envolvidos na atividade desenvolvida. São raros até agora os casos de desapropriação de um imóvel a partir da função social. O critério da produtividade tem se sobreposto, inclusive nos processos judiciais.

No que se refere aos aspectos fundiários, a regulamentação da Constituição de 1988 foi feita por meio da Lei Agrária de 1993, que considera propriedade produtiva aquela que, explorada econômica e racionalmente, atinge, simultaneamente, graus de utilização da terra e de eficiência na exploração, segundo índices fixados pelo órgão federal competente. Segundo essa lei, os índices precisam ser atualizados periodicamente.

Se a agropecuária brasileira é, como tem sido alardeado amplamente pelos porta-vozes do agronegócio, um exemplo de modernização tecnológica, transformando solos antes considerados inférteis em áreas de altíssima produtividade, porque tantos protestos contra a atualização dos índices? À primeira vista parece uma contradição. Certamente, trata-se de um tema para uma pesquisa criteriosa, em diferentes regiões do país.

Todavia, há alguns argumentos dos setores empresariais rurais e seus representantes que podem fornecer pistas interessantes para entender tal oposição ao cumprimento do que estabelece a Lei Agrária. Um deles é a tese de que as próprias leis de mercado têm se encarregado de expropriar os produtores ineficientes e, portanto, a presença reguladora do Estado seria supérflua. Esse argumento aparece, por exemplo, numa carta de 22 de setembro de 2009, assinada por Paulo Skaf, presidente da Fiesp, e por Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura e Presidente do Conselho Superior do Agronegócio dessa importante entidade empresarial paulista.

Segundo eles, “o assunto tornou-se anacrônico, porque foi conceitualmente superado pela história e pela importância dos fatos, que aí estão para condenar a pretendida revisão dos índices de produtividade da agropecuária brasileira” (www.sindiracoes.org.br/index.php).

A medida é condenada também por ser considerada autoritária e atentatória contra o direito de propriedade e liberdade empresarial. Para os que assim argumentam, a definição constitucional de que a terra tem função social é um equívoco. Não faltam os que dizem que ninguém desapropria uma fábrica porque ela não é produtiva.

Compreender as alegações do setor, indo um pouco além dos argumentos que aparecem na imprensa, implica em incorporar à análise a própria lógica da expansão dessa agricultura moderna e empresarial.

A dinâmica da expansão da agropecuária brasileira, cerne do agronegócio, se faz num movimento complexo que tem, de um lado, as terras em produção com, ao que tudo indica, altos índices de produtividade. De outro, terras que estão sendo adquiridas, quer de produtores em crise que vendem sua propriedade para comprar terras mais baratas adiante, quer terras de pecuária, já deflorestadas, “limpas” e prontas para a reconversão produtiva. Trata-se um movimento constante, que envolve tanto a recorrente fracasso de alguns, quanto a prosperidade de outros. Esse movimento tem como um elemento de sua dinâmica a busca de novas áreas para serem incorporadas, mas que não necessariamente são colocadas de imediato em produção. Daí deriva a pressão sobre áreas de florestas, a luta por um afrouxamento nas regras de desmatamento, a crítica à delimitação de reservas indígenas e a oposição à atualização dos índices.

Atentando para essa dinâmica e não para esta ou aquela propriedade, observando os movimentos do mercado de terras em todo o país (que vêm atraindo investimentos de capitais nacionais e estrangeiros), talvez se possa entender melhor por que uma atualização de índices de produtividade, que parece tão simples, é capaz de despertar tanta celeuma. Terras improdutivas ou produzindo pouco fazem parte das necessidades criadas pela expansão das atividades empresariais. Transformá-las em áreas passíveis de desapropriação, com a possibilidade de se transformarem em assentamentos, significa subtraí-las do mercado e excluí-las do cerne desse circuito de reprodução.

*é Professora do CPDA/UFRRJ, pesquisadora do CNPq, da Faperj e do Observatório de Políticas Públicas para a Agricultura (OPPA).

Tributação, democracia e distribuição da riqueza no Brasil

Copiado da Carta Maior

A eterna gritaria da classe dominante brasileira contra a elevada carga tributária no país visa manter a pressão para que ninguém se aventure a alterar substancialmente o modelo vigente, que, segundo estudo do Ipea, é um dos maiores obstáculos para a redistribuição da riqueza no Brasil. Todas as iniciativas do governo Lula para impor maior progressividade ao sistema foram derrubadas no Congresso por uma cerrada barreira dos setores conservadores, capitaneada pelo PSDB. O artigo é de Hideyo Saito.

Hideyo Saito (*)

Pesquisa recentemente divulgada pela imprensa indicou que a elevada carga tributária no Brasil é considerada, pelo eleitor de baixa renda, como o maior obstáculo para que ele possa consumir mais. Segundo matéria de O Estado de S. Paulo, 67% de entrevistados desse universo, com renda familiar de até R$ 465, “dizem preferir um presidente que reduza os impostos dos alimentos para que se compre comida mais barata a um que aumente o Bolsa-Família” (1). Ainda de acordo com o jornal, esses entrevistados concordam que o “melhor para a população pobre é que o governo reduza impostos e tenha menos funcionários, com isso o preço dos produtos cai".

O enfoque reafirma o tratamento costumeiramente dado pela mídia a esse tema, sintetizado na insistente denúncia de que a carga tributária suportada pelos brasileiros em geral é excessiva. Já a ideia de que é melhor pagar menos imposto, mesmo à custa de enxugar o setor público e reduzir despesas sociais parece reviver a mais autêntica cartilha neoliberal. O problema é que a pesquisa não submeteu aos entrevistados as hipóteses mais evidentes, que coincidentemente são o verdadeiro “x” da questão.

Carga elevada para pobre
A carga tributária brasileira é, de fato, excessiva para a população mais pobre. Recente estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), intitulado "Pobreza, desigualdade e políticas públicas", concluiu que o sistema tributário brasileiro é um dos maiores obstáculos ao fim da miséria no país (2). De acordo com o levantamento, quem ganha até dois salários mínimos (R$ 1.020) compromete 48,9% de sua receita com impostos, enquanto os que recebem mais de 30 mínimos (R$ 15.300) sofrem uma carga de apenas 26,3%. Para o Ipea, a carga das pessoas que estão na base da pirâmide teria de cair cerca de 86% para se igualar à das camadas do topo.

Um estudo divulgado em julho de 2009 pela Receita Federal (“Carga tributária no Brasil 2008 – Análise por tributo e bases de incidência”) (3) havia chegado às mesmas conclusões. Revelou que os tributos representaram 35,8% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2008, uma proporção nem tão alta assim, como sustenta a campanha a que nos referimos no início deste artigo. Comparada com a de 28 países-membros da OCDE (dados de 2007), a carga brasileira ocupava apenas o 20º lugar.

O problema real no Brasil, como apontado pelo Ipea, é que a tributação de bens e serviços representa 48,44% do total da carga, enquanto os impostos sobre a renda e o patrimônio correspondem a somente 23,63% (destes, os tributos sobre o patrimônio chegam a 3,18%). A exagerada importância dos primeiros, chamados de impostos indiretos, em detrimento dos últimos, que são os impostos diretos, faz com que o sistema tributário brasileiro seja marcadamente regressivo, isto é, atinja proporcionalmente mais aos pobres, ao contrário do que acontece nos países desenvolvidos.

Paraíso fiscal para o capital e o patrimônio
Enquanto a tributação sobre a renda corresponde a 19% da carga tributária total no Brasil, a média nos países da OCDE chega a 35,7% (ou seja, 88% maior). A arrecadação sobre a propriedade, que no Brasil equivale a 3% da receita total, chega à média de 5,7% na OCDE (90% a mais). Em contrapartida, os tributos sobre bens e serviços, que representam 48% do total no Brasil, mal alcançam 31,5% naqueles países (menos de dois terços). Estes últimos, que podem ser exemplificados pelo IPI e o ICMS, são embutidos nos preços das mercadorias. Como as pessoas mais pobres comprometem a maior parte – se não a totalidade – de sua renda no consumo, elas acabam pagando proporcionalmente mais imposto do que aqueles que têm folga no orçamento. Isto é, quanto mais pobre, mais imposto; quanto mais rico, menos imposto.

Mesmo um estudo de 2003 do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), cujos levantamentos posteriores passaram a ser usados nas campanhas conservadoras já citadas, não escapou de conclusão semelhante à da Receita Federal (4). Tanto que, ao divulgar os resultados, o diretor da entidade, Gilberto Luiz do Amaral, reconheceu: “Aqueles que sobrevivem do seu trabalho sofrem uma tributação de primeiro mundo. Já os que sobrevivem do capital e do patrimônio estão sujeitos a uma carga tributária de paraíso fiscal. Por isso, em nosso país é melhor especular do que produzir ou trabalhar. Essa é uma das razões que explicam o pífio crescimento e a alta concentração de renda que padecemos”.

A primeira tentativa de mudança do governo Lula
O diretor do Ipea, Marcio Pochman, falando sobre o estudo da entidade, sintetizou a situação com as seguintes palavras: “Está em andamento no país um programa de distribuição de renda, mas faltam os de redistribuição da riqueza, entre os quais um sistema tributário progressivo”. A agenda transformadora, contudo, enfrenta poderosos inimigos no país. Um dos dois primeiros projetos enviados ao Congresso Nacional pelo presidente Luis Inácio Lula da Silva, no início de 2003 – a proposta da Emenda Constitucional n.º 42/2003 – tratava, precisamente, do sistema tributário. Entre outras medidas, a proposta previa a inclusão, na Constituição Federal, do princípio da progressividade dos tributos sobre o patrimônio: Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), Imposto sobre Transmissão "Causa Mortis" e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD), Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), Imposto sobre a Propriedade Territorial Urbana (IPTU) e Imposto Territorial Rural (ITR).

O projeto suprimia ainda a exigência de lei complementar para a instituição do Imposto Sobre Grandes Fortunas. Pretendia, finalmente, deixar explícita a incidência de IPVA sobre embarcações (iates, veleiros) e aeronaves (helicópteros e aviões particulares em geral, dos quais o Brasil é detentor da segunda maior frota mundial). A cobrança sobre essas espécies de veículos automotores sempre enfrentou forte reação, resultando em uma situação que escancara o real caráter do sistema tributário vigente: propriedades como carros são tributadas pelo IPVA, enquanto jatos e iates particulares, exclusividade das camadas mais privilegiadas, ficam a salvo de sua incidência. Não foi diferente nessa primeira tentativa do governo Lula de mexer nesse vespeiro: rigorosamente todas as propostas de alteração dos impostos diretos foram derrubadas pelos setores conservadores (PSDB e DEM, notadamente) ainda nas comissões temáticas, nem chegando ao plenário da Câmara dos Deputados. As também anunciadas alterações das alíquotas de outro tributo direto, o Imposto de Renda, para torná-lo mais progressivo, nem chegaram a ser apresentadas pelo governo após essa contundente reação conservadora.

O mesmo destino teve o projeto de lei que instituiria a Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinave), enviada ao Congresso no segundo semestre de 2004. Além de seu conteúdo regulador, ele embutia um tributo sobre o faturamento publicitário das empresas de telecomunicações (rádio e televisão) e o das companhias distribuidoras de cinema. Nesse particular, retirava um privilégio tributário exclusivo desses setores, pois a indústria arca com a incidência do IPI, o comércio, com o ICMS, e até o setor financeiro tem o seu Imposto sobre Operações Financeiras. São tributos que recaem, de alguma forma, sobre os resultados de operações típicas de cada setor, representados pela receita publicitária no caso do segmento de rádio e televisão.

Milionários declaram renda de classe média ao fisco
O comportamento das classes dominantes no Brasil, que certamente está na raiz da extrema concentração de renda e de riqueza no país, já foi exposto sob os mais diferentes ângulos. No campo dos tributos, um estudo da Receita Federal, de 1994, revelou que 460 brasileiros, detentores de patrimônios reconhecidos que vão de US$ 19 milhões a US$ 764 milhões, declararam rendimentos comparáveis aos de um assalariado de classe média (5). O estudo denunciou: “(...) As pessoas mais ricas do Brasil, em geral, consideram-se fora do raio de atuação da Receita Federal e chegam mesmo a desafiá-la acintosamente com os números apresentados nas suas declarações”.

A reação de pessoas da alta sociedade, entidades empresariais, setores da imprensa e do meio político, a uma operação realizada em julho de 2005 pela Receita Federal e pela Polícia Federal no shopping de luxo Daslu, em São Paulo, mostrou-se perfeitamente sintonizada com esse espírito. Os proprietários do estabelecimento e seu contador foram detidos para explicar fortes indícios de um esquema de sonegação de tributos, valendo-se de falsificação de documentos, subfaturamento de importação e uso de empresas-laranja. As pessoas mencionadas repudiaram a fiscalização – e não o grave crime de sonegação imputado à empresa! (6) De acordo ainda com a Receita Federal, os setores de maior renda recorrem ao chamado “planejamento tributário” (utilização de brechas reais ou forçadas da legislação para pagar menos imposto), à contestação judicial ou à sonegação pura e simples para fugir de suas obrigações tributárias. Tantos são os percalços que a história da tributação no Brasil pode ser chamada, mais apropriadamente, de história das restrições ao poder de tributar.

O zelo pelo sigilo bancário e fiscal
É sintomático que apenas a partir de 2001 a Receita Federal tenha podido utilizar dados obtidos graças à CPMF (Contribuição Provisória Sobre a Movimentação Financeira) para a fiscalização do Imposto de Renda (7). Também não surpreenderam as críticas ao então ministro da Fazenda, Antonio Palocci, quando autorizou, em novembro de 2004, o acesso da Procuradoria da Fazenda Nacional ao banco de dados da Receita Federal, com o objetivo de melhorar suas condições para cobrar a dívida ativa (imposto não pago, cuja existência já foi admitida judicialmente ou não foi contestada pelo interessado). Tributaristas, consultores de empresas e imprensa elevaram a voz, declarando-se alarmados pela suposta quebra de sigilo que a iniciativa poderia representar. O Estado de S. Paulo, em editorial, chegou a evocar o romance 1984, de George Orwell, para denunciar a “visão totalitária” que estaria por trás das concepções manifestadas no parecer oficial que fundamentou a flexibilização do segredo (8).

A dificuldade de acesso de órgãos da fiscalização a informações tidas como sigilosas é uma das mais diretas conseqüências da mentalidade da classe dominante brasileira, acima esboçada. O jurista Piero Luigi Vigna, chefe da Procuradoria Nacional Antimáfia da Itália, em declaração à imprensa, em setembro de 2004, foi explícito nesse sentido, ao declarar que o Brasil está na contramão da história e perderá a guerra contra o crime organizado se não abolir a lei do sigilo bancário, que definiu como fonte de impunidade (9). Não por acaso, esse instituto foi praticamente eliminado, para efeito de fiscalização, em quase todos os países europeus, assim como nos Estados Unidos, no Japão e na Austrália. Na Alemanha, começou a vigorar em abril de 2005 a chamada Lei de Encorajamento da Honestidade Fiscal, que deu a todo órgão público de fiscalização acesso irrestrito a qualquer conta bancária, inclusive de entidades de seguro social e caixas de pensão, via internet (10).

A eterna gritaria dos setores dominantes contra a elevada carga tributária no Brasil tem o objetivo, sobretudo, de manter pressão permanente sobre a máquina estatal para que ninguém se aventure a querer introduzir alterações substanciais no sistema de impostos. Da perspectiva dos setores progressistas, contudo, além de uma reforma tributária que corrija profundamente as distorções apontadas, é urgente restaurar a plena soberania do Estado nesse campo, ameaçada, por um lado, pela falência dos instrumentos e formas de ação dos órgãos de fiscalização e, por outro, pela ousadia e sofisticação cada vez maior da sonegação organizada. É uma tarefa que a Receita Federal e outros órgãos de fiscalização já começaram a assumir, mas que só poderá ter consequência maior a partir da mobilização social em torno do assunto. Só assim será possível assegurar a existência de uma política tributária imune aos interesses excludentes das camadas mais ricas da sociedade, passo necessário para a execução de um verdadeiro programa de redistribuição da riqueza no país.

(*) Hideyo Saito é jornalista
.

NOTAS
(1) Julia Duailibi. Eleitor pobre quer corte de tributos. O Estado de S. Paulo, 24/01/2010. O levantamento, realizado pelo Instituto Análise em 2009, ouviu mensalmente mil pessoas, abrangendo 70 cidades de todo o país, incluindo nove regiões metropolitanas. Solicitamos à empresa acesso à integra do trabalho, mas não obtivemos resposta.

(2) Marcelo Cabral. Peso dos impostos ameaça queda nos índices de pobreza. Brasil Econômico, 13/01/2010 e Carga tributária para pobres tem que cair 86% para se igualar aos mais ricos, diz IPEA. Folha Online, 12/01/2010. A pesquisa do IPEA foi feita com base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2003.

(3) A íntegra do estudo pode ser obtida no endereço http://www.receita.fazenda.gov.br/Historico/esttributarios/estatisticas/CargaTributariaBR2008.htm.

(4) A pesquisa “Radiografia da Tributação no Brasil” baseou-se em números de 2002 da arrecadação de impostos dos três níveis de governo, mais a receita da Seguridade Social. O IBPT é uma entidade privada que promove estudos e eventos com o objetivo de apoiar os contribuintes. As declarações foram retirados das seguintes fontes: Alessandra Paz. Estudo questiona divisão da tributação. Gazeta Mercantil, São Paulo, 12/03/2003; e Priscilla Negrão. Impostos engolem 47% do faturamento. DCI, São Paulo, 14/03/2003.

(5) Receita Federal do Brasil. Evasão fiscal dos grandes contribuintes e Programa de Grandes Fortunas. Coordenação do Sistema de Arrecadação. Brasília: 1993 e 1994.

(6) No artigo “As elites e a sonegação”, publicado pela Folha de S. Paulo de 31/07/2005, o economista José Alexandre Scheinkman comentou esse fato com propriedade.

(7) Eis por que os empresários não queriam saber desse imposto, mesmo com alíquota baixa.

(8) Catia Seabra. Palocci autoriza acesso a bases da Receita. Folha de S. Paulo, 25/11/2004; O Estado de S. Paulo. Ditadura fiscal. Editorial, 12/12/2004.

(9) O Estado de S.Paulo. Jurista italiano sugere fim do sigilo bancário, 01/09/2004; O Estado de S. Paulo. Sigilo bancário. Editorial, 05/09/2004.

(10) Assis Moreira. País diminui o sigilo bancário. Valor Econômico, 01/04/2005.

Se o Brasil tivesse imprensa



(copiado do Blog Cidadania.com de Eduardo Guimarães, na foto)





Este país está às portas daquela que talvez seja a mais importante campanha eleitoral de sua história. O governo que emergirá das urnas ao fim de outubro próximo estará incumbido de pilotar um país comparável a um bólido de fórmula 1, transbordante de riquezas e centro das atenções do mundo como jamais aconteceu em sua história.

Se o Brasil tivesse imprensa, TODOS os candidatos a presidente da República estariam sendo inquiridos e investigados, questionados por todos os seus atos e palavras e tendo seus desempenhos em cargos públicos devassados em cada detalhe.

Infelizmente, isso não acontece. Entre Dilma Rousseff e José Serra, apenas a ministra-chefe da Casa Civil é questionada e cobrada e investigada. E nem direi que, em sendo candidata – ou pré-candidata – à Presidência, Dilma esteja sendo mais cobrada e fiscalizada do que deveria. Não. O único problema é que seu principal adversário não está recebendo o mesmo tratamento.

Expoente de um governo exitoso, fato internacional e nacionalmente reconhecido por uma maioria massacrante, a ministra tem cada um de seus atos perscrutados com lente de aumento em todos os jornais, telejornais, rádios e programas de televisão possíveis e imagináveis. Todos os dias é acusada de tudo. Todos os dias é desmerecida. Todos os dias tem sua capacidade questionada.

Seu principal adversário, porém, recebe tratamento diametralmente diferente, a ponto de qualquer notícia negativa sobre ele na imprensa ser recebida com surpresa. Isso ocorre devido à total inapetência da imprensa brasileira em dispensar ao governador de São Paulo o mesmo tratamento que à sua provável principal adversária nas próximas eleições.

O Brasil precisa ser informado sobre os problemas da administração do Estado de São Paulo e da capital paulista tanto quanto é informado sobre os problemas do PAC, por exemplo. E não digo que não existam problemas nos dois lados. Seria impossível. No entanto, o governo de São Paulo que aparece nas tevês e nos jornais é quase que exclusivamente o da propaganda do governador.

E problemas não faltam. O Estado está submergindo em água misturada com excrementos; bairros inteiros estão alagados ininterruptamente há quase dois meses; no centro da capital, centenas de zumbis fumam crack à luz do dia e à vista de quem quiser ver; o metrô e o resto do transporte público estão colapsados; centenas de milhares de paulistanos estão sem água há quatro dias; quando chove, enorme parte da capital fica sem luz, às vezes por um dia inteiro...

Os problemas acima mencionados são apenas os mais dramáticos. Nem falei ainda do espancamento de vítimas dos alagamentos que foram para diante da prefeitura do indicado pelo governador paulista para sucedê-lo na administração da capital para pedirem providências por já não agüentaram mais continuar vivendo em casas inundadas por água suja e fezes, uma situação que já vai completando dois meses.

Se o Brasil tivesse imprensa em vez dessa máfia composta dos piores tipos de escroque travestidos de “jornalistas”, o governador José Serra certamente não se elegeria nem para síndico de prédio, pois sua administração é um desastre.

Enquanto isso, a imprensa se ocupa de criticar e difamar ininterruptamente programas e obras do governo federal mundialmente reconhecidos e que inclusive ajudaram o país a sair mais rapidamente da crise, mas só quando essa imprensa não está a repercutir os insultos desesperados dos aliados de Serra ao presidente da República e à sua pré-candidata a ocupar seu cargo a partir do ano que vem.

E quando um único veículo ousa fazer o que nenhum outro fez, quando a TV Brasil pergunta a Serra quando as setecentas mil pessoas que estão há três dias sem água voltarão a poder tomar banho, o governador, o responsável por resolver essa situação, eleito para tanto, pago para tanto pelos cofres públicos, escandaliza-se e se diz vítima de perseguição.

Desacostumado a prestar contas de seus atos publicamente, Serra não pode conviver com o jornalismo e seus questionamentos naturais a ocupantes de cargos públicos. Para ele, para esse déspota dissimulado, quando o assunto é São Paulo jornalismo é não fazer perguntas e não pedir respostas.

O que é mais assustador é que há risco de alguém como Serra pôr as mãos no governo do país sem que reste ninguém para incomodá-lo. Sua eleição se constituiria no mesmo desastre que foi o governo FHC simplesmente porque o Brasil, como naquela época, continua sem imprensa e, assim, não terá como lhe pedir explicações, que se tivessem sido pedidas ao ex-presidente tucano poderiam ter evitado muito sofrimento.

Se o Brasil tivesse imprensa, toda ela estaria ao lado da TV Brasil e contra a atitude antidemocrática e arrogante do governador paulista contra a emissora pública. Infelizmente, o Brasil é um país onde a comunicação é controlada por bandidos.

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