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Não sou o Afonso Celso, embora nossos nomes se pareçam, mas hoje também posso dizer que me ufano do meu país. Meu ufanismo pode ser menos ingênuo como, dizem, era o daquele conde monarquista. Ainda assim, não deixa de ter sua dose de otimismo crédulo. Quem vem de longe, como dizia o saudoso caudilho Brizola, sabe bem do que estou falando.
E é não é apenas pela nossa recente conquista de 2016. Claro, estou superentusiasmado e patriótico, mas já vivi outras conquistas que não foram capazes de eliminar um sentimento de frustração. Eu estava em Brasília quando o Brasil ganhou o tricampeonato mundial de futebol. Participei como toda gente da festa na Asa Sul e ouvi a multidão cantar Eu te amo meu Brasil, hino de Don e Ravel, mas eu não cantei. Do mesmo modo que meus amigos da época, não compartilhei da alegria da ditadura. Também detestava o patropi do Simonal, que achávamos grotesco e hoje há quem tente reabilitar sua figura.
Sei que agora a situação é diferente. Depois de anos de luta pela redemocratização do país e dos tempos melancólicos da Nova República, da era de privatização de FHC, tenho (temos) o que comemorar. É verdade que não chegamos ao paraíso. Quando vou para o trabalho aqui no centrão de Sampa, tropeço em todo tipo de destroços humanos: drogados, crianças dormindo na rua (não há marquises nem viadutos suficientes), camelôs, homens-sanduiche, prostitutas e prostitutos em vias públicas, enfim, o inferno na terra. Não tenho dúvida de que o bolsa-família é paliativo e de que, além disso, não abarca o universo da miséria cruel.
Também não discordo dos que chamam Lula de populista desde que se entenda populismo como sinônimo de popular, de quem conhece o povo, que conhece sua linguagem e sofre com suas necessidades. Lula se parece com Vargas? Um pouco. Mas a questão não é essa, caros especialistas em populismo do PSDB. O problema não se resume às distorções do personalismo e sim ao que os personagens representam. Tanto Vargas quanto Lula (este, muito mais) representam um Estado mais atuante, indutor do desenvolvimento, árbitro dos conflitos e promotor da justiça social, mas sempre amparado em bases sociais. O PT (se quiserem, o lulopetismo) possui tal força.
Lula compôs com políticos atrasados, a exemplo de Sarney? Certamente, assim como FHC se juntou ao Toninho Malvadeza & cia. O PT financiou partidos coligados com sobras do caixa dois? Também é verdade, do mesmo jeito que os tucanos o fizeram. Mas nada justifica isso, diriam meus colegas de academia, repletos de razões morais e éticas, intransigentemente defensores da mais pura, ideal, límpida política democrática civilizada européia e norte-americana (viva os sacrossantos Berluscone, Sarkozy, Bush e tantos outros), hoje já se preparando para votar no impoluto Serra (que não compõe com os demos) ou em Marina (a evangélica virgem que não aceita o culto à santidade da Virgem Maria). Concordo com vocês, intelectuais acima de qualquer suspeita, mas o mundo não é uma arquitetura teórica bem-concebida, como vocês pensam.
Por trás da visão civilizatória e dos bons modos assépticos dos demotucanos e dos comunistas envergonhados sob a tutela do brutamontes Roberto Freire, estão as privatizações a qualquer preço, a degola do ensino público e a segregação social, políticas que o atual governo tem procurado, com dificuldades superar. Nas entrelinhas cultas do discurso de FHC e seus seguidores se revela o complexo de inferioridade daqueles que negam o Brasil ao se verem no espelho do dito mundo civilizado.
Quando estive na Itália, os estudantes universitários de lá não se cansavam de tecer loas ao Lula e de demonstrar todo o apreço que nutriam pelo Brasil: nossa música, nossa literatura, nosso calor humano, nosso jeito de ser. Acho que eles tinham razão.
Por Antônio Celso, blog Impertinências
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