Carta Maior - José Roberto Torero :
Há duas semanas a revista The Economist disse que o Brasil tem ocupado o espaço deixado pelos EUA na América do Sul. Ou seja, estamos nos tornando imperialistas. Pelo menos, imperialistas regionais. E podemos ver isso claramente no futebol. Paradoxalmente, talvez só venhamos a ser realmente um império no futebol quando derrubarmos nosso imperador.
José Roberto Torero
Vou começar citando a The Economist para parecer sério: há duas semanas a revista britânica disse que o Brasil tem ocupado o espaço deixado pelos Estados Unidos na América do Sul.
Ou seja, estamos nos tornando imperialistas. Pelo menos, imperialistas regionais.
E podemos ver isso claramente no futebol.
Atualmente, no Campeonato Brasileiro, temos mais de vinte jogadores estrangeiros.
Fazemos com o resto da América do Sul o que a Europa faz conosco, tirando-lhes bons e promissores jogadores. Do mesmo jeito que xingamos espanhóis e italianos por levarem nossos melhores atletas, nossos clubes devem estar sendo xingados por nossos hermanos.
Vejamos por exemplo o Internacional, que faz jus ao nome com os argentinos D´Alessandro, Guiñazu e Bolatti.
O Flamengo prefere os chilenos, e tem Maldonado e Fierro como volantes.
O Fluminense pode entrar com um meio de campo totalmente estrangeiro, escalando o colombiano Valencia, os argentinos Lanzini e Martinuccio, e o português Deco, nascido em São Bernardo do Campo.
Quanto ao Botafogo já entrou em algumas partidas com um ataque formado por Loco Abreu e Herrera.
O Atlético Paranaense fez a maior compra de sua história ao trazer o uruguaio Santiago Garcia, e neste fim de semana o equatoriano Guerrón fez o gol da vitória sobre o Flamengo.
O Cruzeiro tem um uruguaio (Victorino), dois argentinos (Montillo e Farias) e um paraguaio (Ortigoza). E o Galo, seu arqui-inimigo, no ano passado chegou a ter cinco jogadores importados ao mesmo tempo.
O chileno Valdívia está no Palmeiras (ou melhor, no Departamento Médico do Palmeiras), os laterais paraguaios Piris e Irrazábal estão no São Paulo e no Vasco, e Escudero e Miralles (mais dois argentinos) jogam no Grêmio.
Orgulho ou vergonha?
Agora, eu vos pergunto, caros leitores:
Devemos ter orgulho ou vergonha de importar tantos atletas? Isso mostra que estamos bem economicamente ou que nossos elencos estão enfraquecidos?
Devemos ter orgulho ou vergonha de vender nossos jogadores para a Europa? Isso mostra que temos o pé de obra mais valorizado do mundo ou que não conseguimos segurá-los aqui?
Na minha opinião, as respostas são orgulho e vergonha.
Devemos ter orgulho por trazer bons jogadores, o que deixa nosso campeonato melhor, com mais arte. E devemos ter vergonha por perder nossos atletas, pois assim vemos jogos piores e somos menos felizes. Só trazendo os melhores de lá e mantendo os melhores daqui conseguiremos realmente ser um império no futebol.
Pois, atualmente, somos um reles subimpério.
Nossos jogadores têm tirado seus passaportes numa velocidade impressionante. Alguns nem fazem dezoito anos e já estão com passagens compradas para Espanha, Itália, Inglaterra, França, Portugal e Alemanha. E, mais recentemente, também para Coreia, China e Leste europeu.
Além disso, acabamos ficando com os sul-americanos que ainda não tiveram destaque suficiente para saírem do continente. Somos apenas um entreposto. O argentino Conca, por exemplo, depois de seu ótimo 2010, trocou o Fluminense pelo Guangzhou Evergrande, da China.
Imperius Rex
Mas as coisas estão mudando. Não perdemos nenhum grande jogador na última janela de transferência. E na penúltima repatriamos Adriano, Ronaldinho Gaúcho e Luís Fabiano. A valorização do real e uma pequena melhora no nível de nossos dirigentes de clubes está mudando o futebol brasileiro. Já não exportamos tanto e importamos cada vez mais.
Para que realmente nos tornemos um império, é preciso que todo o planeta veja nosso campeonato nacional. Temos que vender o show para bilhões de pessoas, e para isso temos que manter os artistas por aqui, o que se faz com competência e honestidade.
Paradoxalmente, talvez só venhamos a ser realmente um império quando derrubarmos nosso imperador.
José Roberto Torero é formado em Letras e Jornalismo pela USP, publicou 24 livros, entre eles O Chalaça (Prêmio Jabuti e Livro do ano em 1995), Pequenos Amores (Prêmio Jabuti 2004) e, mais recentemente, O Evangelho de Barrabás. É colunista de futebol na Folha de S.Paulo desde 1998. Escreveu também para o Jornal da Tarde e para a revista Placar. Dirigiu alguns curtas-metragens e o longa Como fazer um filme de amor. É roteirista de cinema e tevê, onde por oito anos escreveu o Retrato Falado.
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terça-feira, 13 de setembro de 2011
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